Conforme amplamente divulgado na mídia recentemente, a Fundação Instituto de Administração (FIA), instituição privada vinculada à FEA de São Paulo que congrega a maior parte dos docentes da FEA, criou recentemente um curso de graduação em Administração, levantando um debate sobre os impactos dessa iniciativa sobre a graduação oferecida na FEA. Da parte dos alunos, tem prevalecido o entendimento de que a iniciativa configura um prejuízo aos estudantes da USP, na medida em que os interesses da fundação não necessariamente convergem com os interesses da unidade. Da parte dos docentes que apóiam a iniciativa (incluído o Reitor da USP, o prof. Grandino Rodas), além de contribuir para a FEA na medida em que viabiliza a atração dos docentes mais produtivos do país para lecionar na faculdade, a medida constitui considerável inovação pedagógica, com potenciais ganhos de aprendizado na graduação da FEA, que, sabidamente, tem sido uma das unidades mais bem sucedidas no processo de sua internacionalização e busca pela excelência (o chamado “Projeto Universidade de Classe Mundial”, já discutido no texto “Desdobramentos recentes: partidos políticos, projetos em conflito e conceitos em disputa”. Cabe destacar que, em matéria de avaliação da CAPES, todos os cursos oferecidos pela unidade possui nota máxima, equivalente às mais conceituadas do mundo).
O objetivo desse texto, porém, não é discutir a problemática vivida pela FEA, mas considerar alguns fenômenos ali verificados que contribuem para a compreensão do que é e do que queremos que seja a FDRP.
Pois bem. Imagine o leitor familiarizado com a realidade da nossa faculdade, qual não foi minha surpresa ao identificar os “principais diferenciais do Curso” oferecido pela fundação, com mensalidade de R$ 1970,00, que pareceram consideravelmente semelhantes ao que se pretende implementar no nosso curso daqui de Ribeirão (os trechos entre aspas são extraídos diretamente do material da FIA, disponível no website www.fia.com.br):
1) O curso “é oferecido exclusivamente no período diurno e as aulas ocorrem em período integral nos dois ou três anos iniciais”.
2) Máximo de 50 alunos por turma.
3) “Estágio obrigatório, integrando o estágio e o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), de forma inovadora”.
4) “Disciplinas extracurriculares de nivelamento em inglês”.
5) “Ampla formação humanística - capacitação para entender as relações interpessoais e de sua profissão com as questões sociais, políticas, culturais e éticas em relação ao Brasil e ao mundo”.
6) “Em sintonia com o papel das organizações de reduzir as desigualdades sociais no Brasil, a FIA [...] promove políticas públicas de cunho social”.
Por outro lado, nos debates promovidos pelos alunos da FEA, os estudantes reclamam da ênfase dada à construção de um curso de excelência fora da USP. Em notícia veiculada pela Folha, observa-se seu principal argumento:
Para os representantes dos alunos, haveria conflito de interesses entre a FIA e a FEA, que se poderia identificar no fato de a FIA se auto-intitular "a melhor escola de negócios do Brasil" apresentando como argumento para isso vantagens do seu curso de graduação que o da USP não tem. Nas suas próprias palavras: "por que os docentes não propuseram essas transformações [disciplinas em inglês e curso em período integral] na USP?". Para mais detalhes sobre seus argumentos, consultar http://educacao.uol.com.br/ultnot/2011/04/25/fundacao-de-docentes-da-usp-cria-graduacao-paga-e-e-criticada-por-universitarios.jhtm. Assim, dito de forma sucinta, os alunos entrevistados pelo jornal desejam que as características do novo curso da FIA sejam implantadas também nos cursos da FEA-USP. Vejam que ironia: Nos nossos corredores, são as forças contrárias a esse projeto que ganham força entre os alunos.
Como já se observou nesse blog, os principais traços da graduação da FIA também podem ser observados no novo curso de direito oferecido pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Nas palavras do Prof. Celso Fernandes Campilongo, professor das Faculdades de Direito da USP e da PUC-SP:
“Além da estrutura pedagógica deliberadamente voltada para a renovação do modo de ensinar o direito, vale destacar [...] a dedicação integral de professores e alunos, os serviços de suporte acadêmico e a agilidade da modernização do acervo da biblioteca como características interessantes do curso.
A base da inovadora proposta da Direito GV me parece assentada em três fundamentos: i) a reconstituição do direito empresarial à luz das recentes contribuições tanto das teorias jurídicas quanto de suas ligações com as mais modernas teorias econômicas e sociais; ii) a seleção criteriosa, pluralista e planejada de docentes; iii) o recurso a estratégias pedagógicas e o suporte acadêmico modernos”.
Enquanto isso, aqui na FDRP, o esforço de institucionalizar um curso com as mesmas vantagens presentes nos novos cursos da FIA e da FGV tem enfrentado resistências por parte de alunos e professores. Os alunos se orgulham de contribuir para que o estágio seja o mais parecido possível com o que se pratica usualmente na grande maioria das faculdades brasileiras de direito, ao mesmo tempo em que contribuem para que a faculdade em tempo integral não se viabilize. Os professores, por sua vez, coordenam meticulosamente suas ações de forma a criar um ambiente institucional no qual seus interesses pessoais sejam atendidos sem grandes resistências. Ao que me parece, são aspectos do conservadorismo (esforço para manter inalteradas as estruturas de dominação) e do patrimonialismo (confusão entre os interesses público e privado) que tem caracterizado a cultura da elite interiorana desde os tempos da República Velha (a conhecida “lavoura”), que, desta vez, traz seus efeitos destrutivos para a nova faculdade que por aqui tenta se consolidar.
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